O Engenheiro Alberto Martino, o Tito Martino no mundo artístico, como clarinetista de Jazz tocou em New Orleans, em Washington, Nova York mais 12 cidades nos Estados Unidos, e em diversos Festivais de Jazz na Europa, onde residiu por dez anos até 1992. Tem 8 LP’s gravados e cinco CD´s. O seu trabalho foi elogiado por respeitados críticos de Jazz, com suas fotos publicadas no “New York Times”, no “Washington Post” e em revistas de Jazz européias.

Pergunta:- Tito, quando você começou a tocar Jazz e porque?
Tito Martino:- Comecei a tocar banjo em 1957, como brincadeira de estudante, com um grupo de colegas do cursinho. No ano seguinte assisti da primeira fila um concerto de Louis Armstrong, em São Paulo; e assim fui batizado com os respingos do suor do Mestre do Jazz, descobrí que o Jazz Clássico é um tesouro cultural e me decidí a tocar sériamente. Quando entrei no ITA, em 1958, um veterano me fez aprender a tocar clarinete de trote (ele era clarinetista) e assim comecei minha carreira de clarinetista de Jazz. Quando mudei para a Politécnica, em 59, comecei a criar meu primeiro conjunto, que depois batizei de Traditional Jazz Band, o original, do qual fui o band-leader durante 20 anos, até 1983, quando mudei para a Europa. Voltei em 1993, e agora toco com o TITO MARTINO JAZZ BAND, que reúne alguns dos melhores jazzistas brasileiros.

P.:-Como voce consegue conciliar a atividade de Jazzista com a atividade de Engenheiro?
T.M.:- Do mesmo modo que consigo respirar e escrever ao mesmo tempo. Não penso que sejam duas atividades contraditórias que precisem ser “conciliadas”. O espírito humano é muito vasto para ser limitado em currais especializados. Continuo até hoje a atuar na engenharia elétrica, como consultor na área de Consultoria de Eficiência Energética. Para mim é importante porque trata-se de uma atividade com um componente de contribuição à sociedade: preservação ambiental, uso racional da eletricidade com vistas à conservação energética, combate ao desperdício. 

P.:- Então o que é mais importante para você, a Engenharia ou o Jazz?
T.M.:- Penso que tanto a Engenharia como o Jazz são atividades circunstanciais se consideradas dentro de uma perspectiva mais ampla de vida. O que realmente importa é o ser humano e a sua trajetória pela vida, o que você consegue fazer a partir de todos os seus recursos pessoais, questionamentos, talentos e deficiências. Portanto, penso que ser engenheiro ou médico ou padeiro não é mais importante que ser carteiro ou jornalista ou presidente, e nada impede que um engenheiro seja tambem jazzista, pintor, escritor, alpinista, motociclista, cozinheiro e psicólogo, tudo ao mesmo tempo, se isto lhe faz sentido. Depende só de querer… …e poder. 

P:- Tito, o que é o Jazz? Onde e quando nasceu?
Tito Martino:- O Jazz é um terremoto musical que se propagou pelo mundo a partir do início do século 20. O epicentro deste terremoto musical foi localizado em New Orleans, na foz do Rio Mississippi. As raízes do Jazz são os Blues, o Ragtime, os Spirituals, que são formas musicais afro-americanas. Mas também marchas de rua, canções folclóricas espanholas, francesas e inglesas. Sem dúvida há muita improvisação, mas é uma improvisação dirigida, organizada, com limites musicais muito bem definidos. No Jazz é mais importante como se toca do que o que se toca. 
O tempêro mais forte é o ritmo e o balanço dos maravilhosos tambores tribais africanos. Este é o Jazz autentico, sem mistura de componentes musicais comerciais, sem influencia da indústria da canção popular norte-americana, nem do cinema hollywoodiano, o cinema deixou no grande público uma imagem completamente deturpada do Jazz. Musicos criativos podem se inspirar no Jazz e inventar mil diferentes variantes, como de fato surgiu o Be-Bop, a Bossa Nova, o Funk, o Fusion, etc. etc. Todas são formas válidas e boas de ouvir e de tocar, e tem seu público. Mas chamar de Jazz estas variantes é uma afronta à Cultura. O Hermeto Paschoal, que é um gênio criativo, dá boas gargalhadas quando alguem chama de Jazz a música que ele cria. Mas ele já tocou Jazz comigo, pois sabe muito bem a diferença. O Jazz autêntico, que é o Jazz de Raiz, é hoje cultivado e tocado no mundo inteiro por milhares de Jazz Bands e apreciado por um publico muito especial que lota dezenas de Festivais de Jazz Tradicional atraindo até 100 mil ou 120 mil pessoas.

P:- Quando o Jazz chegou no Brasil?
T.M.:- O Jazz começou a ser divulgado no mundo a partir do dia da primeira gravação, em 1917. Os primeiros discos de Jazz certamente chegaram ao Brasil nessa época, importados para a classe mais privilegiada, que já tinha acesso ao fonógrafo. Em 1919 um conjunto de Jazz de New Orleans já excursionava pela Europa; mas no Brasil a primeira banda que chegou ao Rio de Janeiro foi a de Benny Payne, em 1926, seguida pelos Chocolate Dandies de Sam Wooding, em 1927. Nos anos 20 Pixinguinha, com o seu conjunto Oito Batutas, esteve em Paris onde “descobriu” o Jazz e ficou empolgado. Foi de lá que ele trouxe o saxofone, o banjo e a bateria de jazz. É a partir dessa época que muitos conjuntos brasileiros de Samba e Chôro passaram a se auto-intitular “Jazz-Band”, embora não tocassem nada de Jazz.

P:- Então qual foi a primeira banda de Jazz brasileira, digo Jazz de verdade?
T.M.:- É difícil responder, porque a partir de 1930 várias bandas amadoras surgiram, tocando não se sabe bem o que. Quem escreveu sôbre isso foi Lucio Rangel, Jorge Guinle, Sérgio Porto, Edoardo Vidossich. Mas tivemos em São Paulo os Sophisticated Swingers, em 1947, e o Paulistania Jazz Band em 1954, com Booker Pittman. 

P:- Fale um pouco do seus últimos CDs.
T.M.:- O penultino chama-se “Classical Jazz Today” porque é um espelho do Jazz Tradicional como pode ser tocado hoje por jazzistas conscientes e talentosos. O ultimo é o “Jazz Jubilee”, reunindo minhas melhores gravações em 40 anos, de 1967 a 2007. Tenho absoluta certeza de que estes CDs podem ser mostrados com orgulho em qualquer clube de críticos de Jazz, em qualquer lugar do mundo. Afinal, já tocamos no Festival de Jazz de New Orleans e fomos considerados pelos especialistas locais como sendo a melhor banda estrangeira. A minha experiencia tocando em doze cidades norteamericanas, e em Festivais de Jazz na Argentina e na Europa permite afirmar com segurança que estes CDs tem categoria internacional. Os CDs não tem distribuição em lojas; só estão à venda nos nossos locais de apresentação ou por encomenda. 

P.:- Você se considera um bom musico?
T.M.:- Não, eu não sou musico, sou um Jazzista. Ser musico é uma profissão; ser Jazzista é como se fosse uma religião – mas o Jazzista também atua profissinalmente. O musico segue uma partitura; mas o Jazzista cria, decide o que vai tocar, não usa partitura, inventa mentalmente sua propria partitura no momento da interpretação, pois improvisa e dialoga musicalmente com seus companheiros. Dentro de critérios convencionais, eu seria considerado um musico medíocre pois mal sei ler partituras e não tive educação musical formal; e note bem, nisto não sou diferente de muitos dos pioneiros do Jazz de New Orleans, nem de alguns Jazzistas profissionais de grande sucesso da atualidade que mal sabem ler partituras. 
Mas dentro dos parametros do Jazz Clássico, o Jazz de Raiz, recebí muitos elogios de críticos famosos e respeitadíssimos que publicaram minhas fotos como o John Wilson, do New York Times, que disse que tenho meu próprio estilo, ou o Hal Willard, do Washington Post, e de outros críticos europeus. Então sou forçado a acreditar neles.

P:- Com quais jazzistas célebres você já tocou?
T.M.:- Aquí em São Paulo, com Oscar Peterson, Teddy Wilson, Cat Anderson, Bob Wilber, Rufus Jones; e nos Estados Unidos, com os Dukes of Dixieland, Roy Eldridge, Louis Barbarin, Alvin Alcorn; na Suiça, com o grande Louis Nelson, trombonista de New Orleans, e o clarinetista inglês Sammy Rimington. Foram grandes momentos. Ninguem estava tocando para provar nada; 
só porque gostamos de “conversar” no mesmo idioma musical – o Jazz Clássico de New Orleans. O Oscar Peterson disse ao consul norteamericano depois de tocar conosco: “I can´t believe! It looks like my days in Chicago!”. Por pura sorte, esta Jam Session foi gravada. Tambem a Jam com Louis Nelson, no Festival de Jazz de Ascona, na Suiça. E foi na Suiça que o Hermeto me chamou ao palco para eu tocar um tema de Jazz com ele e o Grupo dele. E tocou um autentico Blues no piano, que eu acompanhei muito à vontade. Os meninos (como ele costuma chamar) do Grupo arregalaram o olho pois não esperavam isso! Mas logo saíram acompanhando e tudo deu certo.
Em New Orleans toquei com a formação renovada do Dukes of Dixieland, numa jam-session, e ao terminar, o grande pistonista afro-americano Alvin Alcorn (tocou na banda do pioneiro Kid Ory) bateu no meu ombro e disse : “Sabe o que, baixinho? Voce é negro por dentro”. Foi o maior elogio que recebi na minha carreira de jazzista. 

P.:-Onde você tem tocado? 

T.M.:-Minha agenda de apresentações está no site TITO MARTINO JAZZ BAND que pode ser acessado neste link   www.titomartinojazz.com.br” 

P:- Quando será seu próximo Concerto importante?
T.M.:- Para mim a próxima apresentação seja onde for é a mais importante!

P:- Que mensagem você quer deixar para os nossos leitores?
Tito Martino:- Queria que todos soubessem que o Jazz é entretenimento, sim, é diversão, mas é também um tesouro cultural … é Musica em sua plenitude…. é repleto de história, anedotas, sensualidade, espiritualidade, emoção, alegria, melancolia, poesia, paradoxos, imprevistos, fantasia e dura realidade; e tudo isso aparece em nossos Shows ! O bom Jazz lava a alma! Mas atenção, Jazz não é “qualquer musica com nome de jazz” ! Não basta ser virtuose num instrumento para tocar jazz autentico. É preciso conhecer a história e a sintaxe musical do Jazz Autentico, e principalmente, ter SWING! O grande “Duke” Ellington dizia: “It don´t mean a´thing if it ain´t got THAT swing”. Que eu traduzo assim: “Não é Jazz e não vale nada se não tiver “ESTE” swing” !